*por Luiz Paulo Vellozo Lucas
Os jornais da semana noticiaram que os governos, federal, estadual e municipal do Rio de Janeiro vão criar uma Empresa de Propósito Especifico (SPC) junto com a Infraero e a Changi, empresa privada concessionária do aeroporto do Galeão para administrarem conjuntamente os dois aeroportos: O Galeão e o Santos Dumont. Mais uma questão de disputa de poder entre entes federados que atuam num mesmo território que se equaciona com uma inovação institucional de tipo “arranjo transfederativo”.
Em 1912, portanto há mais de um século, na foz do rio Hudson, o governo americano criava a “New York and New Jersey Port Autority” reunindo num único conselho gestor as prefeituras de New York e Jersey City, os governos dos estados de New York e New Jersey e o governo federal. Todo o aproveitamento econômico dos territórios nas margens da região, os portos e os aeroportos das duas cidades são de propriedade desta autoridade pública compartilhada. Ao longo de mais de cem anos ela construiu pontes, tuneis, viadutos, sistemas de transporte coletivo, prédios residenciais e comerciais, shopping centers, arenas esportivas, museus e parques. Mais de trezentas empresas privadas concessionadas são responsáveis pelas obras, serviços e empreendimentos do arranjo governamental nova-iorquino.
O Plano de Investimento decenal 2017-2026 aprovado pelo Conselho de Administração tem uma previsão de US$ 32,2 bilhões que inclui projetos como a adaptação da George Washington Bridge para pedestres e ciclistas. As tarifas cobradas nos portos e aeroportos bem como os lucros patrimoniais advindos dos empreendimentos realizados pela autoridade portuária são a fonte de receita básica e as operações de crédito e de captação em mercado de capitais complementam o financiamento de suas atividades desde sua criação. As torres gêmeas do World Trade Center destruídas no atentado de 11 de setembro e o novo One World Trade Center são empreendimentos da NY and NJ Port Autority.
A valorização imobiliária que acontece quando o espaço urbano se qualifica, se sofistica, se embeleza, proporciona novas atividades econômicas e aumenta a qualidade de vida precisa ser parte integrante da solução de financiamento do investimento no desenvolvimento das cidades. As infraestruturas de transporte, estradas, ferrovias, portos e aeroportos integram e valorizam novos territórios que por sua vez demandam novos e melhores serviços urbanos. O Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001) prevê mecanismos financeiros para esse fim, como as Operações Urbanas Consorciadas, ainda é muito pouco utilizado.
É inacreditável que, no Brasil, a União Federal ainda seja autoridade fundiária nas terras urbanas nas orlas e nos espelhos d’agua parasitando e impedindo o desenvolvimento das cidades, principalmente as costeiras. Prédios e terrenos federais abandonados que desvalorizam e enfeiam as cidades brasileiras mais antigas ainda são tratados como bens privados pela União.
Inovações institucionais e gerenciais tais como a SPC a ser criada para gerir os aeroportos do Rio de Janeiro; o modelo de reestruturação de capital que permitiu a entrada da iniciativa privada na CEDAE também no Rio de Janeiro; o acordo de gestão compartilhada entre a União e o governo de Pernambuco para administrar o arquipélago de Fernando de Noronha são exemplos de arranjos que driblam a rigidez e o formalismo burocrático da estrutura federativa brasileira. A reforma do estado e a modernização de suas atribuições em articulação com a iniciativa privada e as forças de mercado está em curso, ainda que lentamente, através destas iniciativas que enfrentam e resolvem disputas de poder, disfunções e lacunas na estrutura estatal.
Colocar a solução das questões concretas no centro da agenda e estruturar modelos institucionais inovadores para superar obstáculos e aproveitar as oportunidades existentes em um determinado território é o desafio da governança compartilhada. Um método testado para impulsionar o desenvolvimento sustentável das cidades e do país.
Na eleição presidencial de 1992 Bill Clinton venceu George Bush, orgulhoso vencedor da guerra do Golfo, ao adotar o slogan sugerido por seu marqueteiro James Carville “É a economia, estupido! ”.
No Brasil temos que adotar: “É o território, estupido! ”.
*Luiz Paulo Vellozo Lucas – Luiz Paulo Vellozo Lucas – engenheiro de produção pela UFRJ com cursos de pós graduação em finanças (Arthur Andersen), desenvolvimento econômico (BNDES) e economia industrial (IE-UFRJ), mestrado em Engenharia e Desenvolvimento Sustentável pela UFES. Foi funcionário de carreira concursado do BNDES onde ingressou em 1980, aposentando-se em agosto de 2016. Foi prefeito de Vitória por dois mandatos consecutivos (1997-2000 e 2000-2004), deputado federal pelo Espírito Santo e foi diretor Presidente do BANDES, Banco de Desenvolvimento do Espirito Santo entre 2015 e 2016 e do IJSN-Instituto Jones dos Santos Neves entre 2019 e 2020. Atualmente é Sub Secretário de Desenvolvimento Econômico do governo do Espirito Santo. Luiz Paulo escreve quinzenalmente, sempre às sextas-feiras.
Fonte: Site ES Hoje