A trigésima-primeira edição do Festival de Cinema de Vitória exibe, a partir desse sábado, 20 de julho, 74 filmes distribuídos por doze mostras. Dois atores – o baiano Lázaro Ramos e a capixaba Suely Bispo – serão homenageados por suas trajetórias e terão suas vidas narradas em publicações (“Caderno do Homenageado”) editadas pelo próprio festival.
Em sua competição principal, o mais tradicional festival do Espírito Santo soma oito curtas-metragens capixabas e doze brasileiros, em sessões que costumam abarrotar o histórico Cine-Teatro Glória, mantido pelo Sesc. Os longas-metragens ainda não conseguiram mostrar tamanho poder mobilizador.
A safra que, este ano, disputará o Troféu Vitória compõe-se com “Sekhdese”, das pernambucanas Graciela Guarani e Alice Gouveia, “Café, Pépi e Limão”, dos baianos Adler Kibe Paz e Pedro Léo, “Não Existe Almoço Grátis”, dos brasilienses Marcos Nepomuceno e Pedro Charbel, “Quando Eu me Encontrar”, das cearenses Amanda Pontes e Micheline Helena, e “Presença”, do capixaba Erly Vieira. Este, sim, deve superlotar o cinema, já que a prata-da-casa costuma causar furor somando ao público suas equipes artística e técnica.
Afinal, todos querem prestigiar os profissionais que estão colocando o Espírito Santo na mapa cinematográfico brasileiro. Claro que se faz cinema em solo capixaba há muitas décadas. Mas não com a frequência (e quantidade) da última década. Ano passado, um curta capixaba, o inventivo “Remendo”, de Roger Gil (ou GG Fákòlàdé), conquistou prêmios de primeira linha nos festivais de Gramado (melhor filme, em agosto) e de Brasília (melhor direção, em dezembro).
Além das mostras competitivas de curtas (do estado sudestino e de todas as regiões brasileiras) e de longas-metragens, o Festival de Vitória — que prossegue até dia 25 de julho — exibirá mostras temáticas de nomes e alcance facilmente decifráveis (Negritude, Cinema Fantástico, Ambiental, Cinema de Mulheres) e outros mais enigmáticos (Mostra Corsária, Quatro Estações). O segmento Outros Olhares se divide em dois programas Outros Brasis e Meu Corpo é Outro.
O chamado Cinema de Bordas segue com mais um programa comandado pela professora Bernadette Lyra, que integra o time de personalidades homenageadas pelo festival em suas três primeiras décadas de existência.
Todos os filmes das mostras paralelas serão exibidos em horários vespertinos e ocuparão salas (Cariê Lindenberg e Marien Calixte) situadas em andares superiores do tradicional Glória. Este cine-teatro localiza-se no térreo de prédio restaurado, constituindo-se, portanto, no que chamamos de “cinema de rua”. Daqueles com pipoqueiro na porta e clima de antigamente. Outro segmento badaladíssimo do festival capixaba é a Mostra Nacional de Videoclipes.
Dois filmes terão sessões hors concours: o média-metragem capixaba “Não se Aproxime – A Vida e a Obra de Carmélia M. T. de Souza”, de Tati Rabelo e Rodrigo Linhares, e o documentário “Lobby do Batom”, de Gabriela Gastal.
O primeiro, que presta tributo à cronista Carmélia Maria de Souza (1936-1944), mulher negra, homoafetiva e de escrita mordaz. Atrevida, ela definia seus conterrâneos como “um povo deletério”. Carmélia, que morreu há exatos 50 anos (tinha apenas 37), empresta seu nome a teatro capixaba e deixou apenas um livro impresso (“Vento Sul”) com parte de seus textos escritos ao longo de 17 anos.
“Não se Aproxime” será exibido na noite da entrega dos troféus Vitória aos vencedores e de homenagem ao ator (“Madame Satã”), cineasta (“Medida Provisória”) e escritor (“Na minha Pele”) Lázaro Ramos.
O segundo filme – “Lobby de Batom” – mobilizará o público feminino para concorrido debate, já que seu tema são as lutas empreendidas pelas mulheres na Constituinte de 1988. Reunidas sob o slogan “Constituinte para valer tem que ter palavra de mulher”, a brigada feminina marcou presença ativa no Congresso Nacional.
As lideranças do movimento, que encontraram grande aliado em Ulisses Guimarães, o “Sr. Constituinte”, tinham na ruidosa atriz luso-brasileira Ruth Escobar sua estrela. Ela somou-se às militantes Jacqueline Pitanguy, Anna Maria Rattes, Comba Marques Porto, Hildete Pereira de Melo, Leila Linhares Barsted, Marina Colasanti e Schuma Schumaher. E tanto fizeram que conseguiram, no dia da promulgação da nova Constituição Brasileira, que o velho Ulisses (1916-1992) usasse as próprias mãos para fazer o “gesto vaginal”, símbolo do Poder Feminino.
O documentário resgata, em sintéticos 60 minutos, o pequeno exército de Brancaleone, ou melhor, de Ruth Escobar, visto em fotografias ou imagens em movimento, invadindo o Congresso Nacional com suas pautas em defesa dos Direitos da Mulher. Elas eram tão atuantes, que ao vê-las chegar, parlamentares de sexo masculino ironizavam: lá vem o “Lobby do Batom”. No começo, as militantes feministas não gostaram do aposto. Depois, entenderam que a expressão dava voz a segmento importantíssimo de nossa história, calado por séculos. E o adotaram.
O Festival de Vitória faz questão de cuidar, além da exibição de longas e curtas-metragens, de atividades no campo reflexivo e educativo. Assim sendo, diariamente, a roteirista e agitadora cultural Viviane Pistache vai moderar debates de todos os filmes das mostras competitivas. E gente dedicada ao audiovisual brasileiro ministrará masterclass (caso do ator Silvero Pereira, que falará sobre o processo criativo e as músicas de Belchior, ele que participou do filme “Apenas um Coração Selvagem”), palestras (Johnny Massaro, sobre as “Artesanias da Atuação”) e oficinas (“Storytelling”, com a diretora Sabrina Fidalgo, e “Distribuição e Promoção para Filmes de Baixo Orçamento”, com Leila Bourdoukan). Victor Búrigo vai mediar mesa sobre a trajetória da atriz Marcélia Cartaxo (“De Macabéa a Pacarrete”).
Competitiva de longas-metragens
. “Presença” (Erly Vieira Jr, ES, 71′) – Documentário capixaba, único representante do estado na competição de longas-metragens, marca a estreia de Erly no formato. O filme registra as carreiras de três afro-brasileiros que fazem de seus corpos os meios e objetos de sua criação artística (Marcus Vinícius, Castiel Vitorino Brasileiro e Rubiane Maia).
. “Sekhdese” (Graciela Guarani e Alice Gouveia, doc., PE, 78′) – Esse documentário pernambucano escolheu vocábulo da língua do povo Fulni-ô, o Yathê, para nominá-lo. Sekhdese significa sabedoria. A sabedoria de mulheres indígenas, que lutam pela terra, pela cultura de seu povo, pela defesa do meio-ambiente e contra o etnocídio do qual são vítimas. E, também, enfrentam as investidas das igrejas neopentecostais.
. “Não Existe Almoço Grátis” (Marcos Nepomuceno e Pedro Charbel, DF-RJ, 74′) – Esse documentário brasiliense, realizado em parceria com produtora carioca, acompanha três mulheres (Socorro, Jurailde e Bizza), que atuam no projeto Cozinhas Solidárias do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto). Elas vivem numa das maiores favelas do país, em Ceilândia, e preparam refeições para trabalhadores que chegam para a posse de Luiz Inácio Lula da Silva em seu terceiro mandato presidencial.
. “Café, Pépi e Limão” (Adler Kibe Paz e Pedro Léo, BA, 71′) – Longa ficcional baiano acompanha três adolescente, a jovem Pépi, de 16 anos, violentada pelo padrasto, que será expulsa de casa pela própria mãe. Limão, de 14, mora em um buraco, sob um viaduto, com Marta, debilitada pelo vício. Café, também de 16 anos, foge do interior por causa de ‘vingança de família’, e toma o rumo da capital, onde tentará encontrar o pai encarcerado.
. “Quando Eu me Encontrar” (Amanda Pontes e Michelline Helena, CE, 77′) – Nessa ficção cearense, acompanhamos Marluce (a ótima Luciana Souza), mãe que sofre com a inesperada partida da filha Dayane, mas tenta manter-se firme em suas duras obrigações cotidianas, para não abalar Mariana, sua caçula. A adolescente enfrenta problemas de adaptação na nova escola em que foi matriculada. O noivo rejeitado de Dayane, que trabalha numa sapataria, também não compreende as razões de tão inesperado abandono.
Competitiva Nacional de Curtas
. Dias de Pouco Pão e Zero Sonho (Saskia Sá, ficção, ES, 17’)
. Travessia (Karol Felicio, doc, ES, 15’)
. Saudades em Cor (Arthur Felipe Fiel, animação, ES, 10’)
. Deusa Menina (Juane Vaillant, ficção, ES, 18’)
. Pássaro Memória (Leonardo Martinelli, ficção, RJ, 15’)
. Como Chorar Sem Derreter (Giulia Butler, ficção, RJ, 15’)
. Vollúpya (Éri Sarmet e Jocimar Dias Jr., doc, RJ, 21’)
. Viventes, (Fabrício Basílio, ficção, RJ, 20’)
. Se Eu Tô Aqui é por Mistério (Clari Ribeiro, ficção, RJ, 22’)
. Eu Fui Assistente do Eduardo Coutinho (Allan Ribeiro, doc., RJ, 17’)
. Quinze Quase Dezesseis (Thais Fujinaga, ficção, SP, 20’)
. Vão das Almas (Edileuza Penha de Souza e Santiago Dellape, ficção, DF-GO, 15’)
. Axé Meu Amor (Thiago Costa, ficção, PB, 18’)
. Zagêro (Victor Di Marco e Márcio Picoli, ficção, RS, 15’)
. Quebrante (Janaina Wagner, doc , PA-SP, 23’)
. Samuel Foi Trabalhar (Janderson Felipe e Lucas Litrento, ficção, AL, 17’)
Mostra Foco Capixaba
. O T-Rex e a Pedra Lascada (Luã Ériclis, ficção, ES, 16’)
. Fala, Vô! (Felipe Risallah, animação, ES, 10’)
. Mulheres Maratimbas (Thais Helena Leite, doc., ES, 15’)
. O Caboclo do Sapê (Ricardo Sá, doc., ES, 17’)
Mostra Cinema e Negritude
. Baobab (Bea Gerolin, ficção, PR, 10’)
. Jussara (Camila Cordeiro Ribeiro, animação, BA, 9’)
. O Lado de Fora Fica Aqui Dentro (Larissa Barbosa, ficção, MG, 25’)
. Escavação (Alex Reis, experimental, RJ, 5’)
. Pedagogias da Navalha – Se a Palavra é um Feitiço, minha Língua é uma Encruzilhada (Colle Christine, Alma Flora e Tiana Santos, doc, RJ, 15’)
Mostra Mulheres no Cinema
. Maré Braba (Pâmela Peregrino, anim., BA/CE, 7′)
. Aquela Mulher (Cristina Lago e Marina Erlanger, fic., RJ, 14′)
. Uma Mulher Comum (Debora Diniz, doc, SP-ARG, 20′)
. A Velhice Ilumina o Vento (Juliana Segóvia, fic., MT 21′)
Cinema Fantástico
. Do Observatório me Viram (Thaís Silva e Giovanna Giovanini, doc., MG-RJ, 22’)
. Arapuca (Joel Caetano, ficção, SP, 20’)
. Curacanga (Mateus Di Mambro, animação, BA, 18’)
Mostra Nacional de Cinema Ambiental
. A Fumaça e o Diamante (Bruno Villela, Fábio Bardella e Juliana Almeida, doc., DF, 2023, 5′)
. Elizabeth (Alceu Luís Castilho, Luís Indriunas e Vanessa Nicolav, doc., PB, 2023, 18′)
. Bauxita (Thamara Pereira, doc, MG, 2023, 15′)
. Antes que o Porto Venha (Isabela Narde, doc., ES, 2023, 23′)
Mostra Outros Olhares (Programa Meu Corpo é Outro)
. Nó em Ponta de Estrela (Helena Santos, ficção, RJ, 16’)
. Alienígena (Ricardo Peres e Wagner Lima Mendes, ficção, CE, 15’)
. Tiranossauro (Fausto Prieto, Ingrid Gaigher, ficção, SP, 8’)
. A Mulher Invisível (R.B. Lima, ficção, PB, 21’)
Mostra Outros Olhares (Programa Outros Brasis)
. Canto das Areias (Maíra Tristão, doc, ES, 21′)
. Celebrazione (Luiz Carlos Lacerda, ficção, RJ, 20′)
. Macaléia (Rejane Zilles, doc, RJ, 25′)
Mostra Corsária
. Prólogo (Natália Dornelas, experimental, ES, 4’)
. Dona Beatriz Ñsîmba Vita (Catapreta, ficção, MG, 20’)
. Guarda Vieja 3458 Timbre 3/6 (Karen Akerman e Miguel Seabra Lopes, exp-doc-fic, RJ, 12’)
. A Última Valsa (Fábio Rogério e Jean-Claude Bernardet, doc, SP, 6’)
. Yãmî Yah-Pá – Fim da Noite (Vladimir Seixas, ficção, RJ, 17’)
Mostra Quatro Estações
. Quando Você Vem me Visitar (Henrique Arruda, experimental, PE, 6’)
. Ficção Suburbana (Rossandra Leone, ficção, RJ, 18’)
. Onde está Mymye Mastroiagnne? (Biarritzzz, experimental, PE, 16’)
. Pirenopolynda (Izzi Vitório, Bruno Victor e Tita Maravilha, doc., GO-DF-CE, 23’)
Mostra Cinema de Bordas
. A Noite das Vampiras (Rubens Mello, ficção, longa-metragem, SP)
Mostra Nacional de Videoclipes
. Tirar o Melhor do Pior, de Everton Radael. Artista: Auri (ES)
. Água Salgada, de Wyucler Rodrigues. Artista: Ada Koffi (ES)
. Palavras Mágicas, de Carlon Hardt. Artista: Renan Inquérito, Emicida e Adriana Partimpim (PR)
. Longe do Medo, de Luiz Vilemen da Fonte. Artista: Felipe S. (PE-SP)
. Babilônia, de Ricardo Monteiro. Artista: Pedro Santos (SP)
. Boca do Cais, de Luna Colazante. Artista: Murica feat yung vegan (DF)
. Forte como Fogo, de Mariano Tavares e Rita Machado. Artista: Mariano Tavares (RN)
. Louva Deusa, de Pedro Henrique França. Artista: Letrux (RJ)
. Cobra coral, de Julia K. Rojas. Artista: Simon Aftalion ft. Orquidália e Nalu (SC)
. Mais uma Vez, de Pablo Violante. Artista: Jovem Ch, Lipinho, Gabrá (RJ)
. Moço, de Luana Luz Iamamoto. Artista: Luana Luz Iamamoto (SP)
. Mais Aceso que o Diabo, de Juno. Artista: Apenas Juno (RN)
. Meredith Monk – Mete Dance, de Mooluscos. Artista: Yma & Jadsa (SP)
. Quando Quiser, de Diego Moreira Barreto. Artista: Depratie (MG)
fonte: site revistadecinema