Deixou-nos o Padre Rômulo. Difícil falar de uma pessoa tão complexa e ao mesmo tempo primor de simplicidade. Convivi mais próximo a ele quando fui chamado a dirigir o jornalismo da Rádio Diocesana. Na verdade, além da rádio, editava também o Jornal Diocesano. Éramos vizinhos de trabalho. Eu na redação da rádio e ele ali ao lado, na Catedral de São Pedro.
Ainda hoje não sei como me aceitaram lá, já que nunca fui muito entendido das hostes religiosas. Aportei na rádio por intermédio do Parraro Sherrer, então apresentador da emissora. Sem dúvida, meu nome passou pelo crivo do monsenhor Rômulo, que não colocou objeções. Deve ter me visto como uma ovelha desgarrada e pensou ser boa a oportunidade de ajuntar-me ao rebanho.
Toda vez que tinha dúvidas, ele estava lá a me aconselhar. Assim como o padre José Carlos, meu guru espiritual, que, às escondidas, chamávamos de “boleba”. Perdoa-me, padre, por essa indiscrição fora do confessionário. Não sei a origem do apelido, acho que era coisa do saudoso Mauri Cardoso, que também já se encontra nos braços e abraços do Pai.
O Padre Rômulo era diferente. Morria de medo dele me rifar do emprego, dadas minhas insubordinações mundanas. Todavia, sempre teve por mim paciência de Jó. De minha parte, secretamente, o admirava. No altar, era meu ídolo. Imaginava assim: “Se fosse para um dia vestir a batina, seria como ele, sujeito tinhoso”.
Gostava de observá-lo, participava de algumas das missas que ele presidia. Isso mesmo, aprendi com ele que o padre preside a missa. Ficava ali desconfiado e inebriado. Hoje sou mais praticante. Espirituoso, o capelão boa praça da Catedral tinha como desiderato ajudar ao próximo. E como hobby, azucrinar o Ferraço.
Pároco de orientação progressista, não perdia oportunidade de alfinetar o prefeito do século. E teve troco. Num de seus arroubos, Ferraço, já de saco cheio, lançou aos clérigos a alcunha de homens-de-saia. E não era pra menos, a linha editorial da Diocesana era de amargar. Mesmo nas celebrações, sobravam parábolas em direção ao alcaide.
Engraçado é que o vigário mais se divertia do que se aporrinhava com isso. Creio que o Ferraço, no fundo de sua religiosidade, também se divertia. Opostos que convergiam em algum ponto do universo, talvez n’algum buraco negro, ou mesmo na lua, capitaneados por São Jorge. O fato é que o espírito combativo do Padre Rômulo nunca o abandonou. Seus textos, suas falas, seu comportamento, às vezes nada ortodoxos, miravam sempre na promoção da justiça social.
O monsenhor foi pro céu, indubitavelmente, mas deixa na vida terrena uma vasta obra a ser admirada e compartilhada. Tristeza era palavra que não existia em seu vocabulário. Por isso, recuso-me às lágrimas. É sabido que, assim como nós, simples mortais, ele bem que tomava uma cervejinha. Até porque, era filho de Deus e gostava de esticar uma prosa.
Considerava todos do mesmo jeito, não importava se esperando à sacristia estava o comendador Camilo Cola ou o inesquecível “Agulha”, que virou nome de viaduto. Aliás, se o Agulha estivesse vivo, até explicar que viaduto é nome de ponte…
Paro por aqui. Fico com imagem serena do monsenhor, que viveu na graça do bom combate.
Descanse em paz, amigo!!