Essa semana foi trágica para a população do Espírito Santo. Um jovem menor de idade usando as armas do pai, um tenente da PMES, entrou em duas escolas e matou quatro pessoas (até agora).
Um caso grave como esse não poderia deixar de suscitar muitas dúvidas, discussões. As polícias estaduais rapidamente solucionaram o caso, mas diversas questões ainda estão por esclarecer. Na esteira da angústia do episódio, surgem temas diversos, seja por oportunismo, pelo impacto da situação, ou mesmo pelo contexto que, de fato, produz um desconforto muito grande. A maioria de nós possui filhos, sobrinhos, na faixa idade das vítimas, ou que são professores, e que poderiam ter sido vítimas desse jovem.
Tema que rapidamente se acendeu diante dessa tragédia foi o da redução da menoridade penal para 16 anos. A discussão é totalmente despropositada, sem o menor fundamento. Trata-se de episódio raro, incomum e evidencia claramente a necessidade de existir o critério da menoridade penal, e não de extingui-la. Isso porque, aos precedentes do ato do garoto, existem situações que necessitam de verificação à luz do próprio Estatuto da Criança e do Adolescente, como por exemplo:
Como esse rapaz teve acesso a armas de fogo e como aprendeu a usá-las? Não se trata aqui de uma discussão sobre mais ou menos armas porque o pai era oficial da PMES, logo, ter arma de fogo não é uma escolha, mas uma contingência profissional. Ensinar o garoto a atirar e não controlar o acesso às armas, essa sim é uma situação que necessita de investigação. E até que medida é aceitável que um rapaz de tão tenra idade tenha tanta habilidade com armas de fogo?
Por qual motivo usar uma suástica? No vídeo e nas investigações preliminares está claro que o garoto fez um símbolo nazista na roupa que usou ao cometer os atos. Circulou nas redes sociais uma postagem do pai em uma publicação em que faz elogios à leitura, e o livro em tela é “Minha Luta” de Hitler, uma obra criminalizada em diversos locais do mundo. Ora, usar a suástica nas vestimentas foi coincidência? Foi coincidência o pai ler um livro de Hitler e o garoto se vestir de nazista para matar? Esse garoto tem ligações com grupos neonazistas (que vem crescendo no Brasil) pela internet? Isso é um conteúdo adequado para um garoto dessa idade?
O garoto tem problema mental? Uma discussão espinhosa, na medida em que não se deve vulgarizar questões mentais e muito menos usá-las como subterfúgio para justificar crimes. Por outro lado, não se deve ignorá-las. Há de se investigar, mas, ainda que no futuro seja comprovada algum tipo de desordem mental que justifique o atentado (o que eu duvido muito), seria necessário avaliar como se deixam armas e literatura nazista ao acesso de um garoto menor de idade com distúrbios mentais.
No fim das contas, não há de se discutir redução da menoridade penal, mas responsabilização dos adultos. E não apenas os pais. Nós também devemos nos responsabilizar.
Nós que defendemos slogans nazistas como “Deus, pátria e família” e depois nos lamentamos que um garoto – vestido de nazista – entre em escolas atirando e matando. Nós que defendemos a violência ao invés do diálogo; nós que defendemos resolver as coisas por meio de armas; nós que justificamos – passamos o pano – para discursos de ódio, homofóbicos, racistas, alegando que “é só retórica”. Aí está a retórica.
Faz alguns anos venho alertando o quanto “boas” pessoas se deixaram encantar pela cadela do fascismo no cio, e andam a coadunar em maior ou menor grau, mais ou menos explícito, com o que há de pior nos “anti” valores de nossa civilização. Tem cheiro de nazismo, tem roupa de nazista, tem símbolo nazista, tem slogan de nazista, mas não é nazista? Me poupe.
Não tenho a menor dúvida que os pais do garoto que perpetrou esse ato estão absolutamente arrasados pelo ocorrido. E as famílias das vítimas ainda mais.
Mas precisa ficar claro que a serpente saiu do ovo, foi alimentada e cresceu antes de morder.
E ninguém viu?
Viu sim.
Estamos vendo já faz tempo.