Jovem, engajado num grupo religioso de dependentes químicos em Cachoeiro, sem experiência, pouco ofertava. Sérgio, depois de uma overdose, vivia lunático. Sem explicar, me adotou. Pouca conversa entre nós, mesmo assim, havia diálogo.
Marquei um retiro no Haras Brunella, em Guarapari, do casal de amigos David Lacerda Fafá e Eunice Fafá. Quando íamos sair, vi Sérgio perto de mim. Pensei: – Não vou levar esse doidão.
Coloquei no carro e o levei para casa, no bairro Sumaré. Falei para seus pais que eu não queria levá-lo. Os pais, cheios de argumentos, falaram que ele queria ir e eles ficariam felizes. Entrei no carro sem argumentos e ele sentado e feliz.
Abreviarei episódios dessa convivência amiga, escreverei o último.
Churrasco com amigos e amigas na casa dos pais de Wanessa Santana. Sem argumentos, tive que levar meu tutor. Depois eu iria ao baile no Jaraguá Tênis Clube. Acabou o churrasco e levei Sérgio em casa. O que acham que aconteceu?
Isso mesmo. Não se mexia no carro, pressenti que queria ir ao baile também. Fiquei zangado e sem argumentos seguimos para o baile. Curvei por trás da rodoviária para subir o morro, ainda não havia edifícios ali. Vi um cidadão desesperado fazendo sua necessidade.
Com medo da consciência me acusar por não agir, parei o carro ao lado do cidadão. Segundos intermináveis, educadamente, falei baixo para o meu querido tutor: – Pergunta se ele tem papel.
Acreditem, ele, que raramente falava, abriu o vidro e carinhosamente perguntou:- Você tem papel?
Naqueles segundos demorados e silenciosos, engatei a marcha, saí e o Sérgio deu um sorriso contido.
Eu, quieto e feliz pensei: – Ganhei a minha noite!
Nunca mais o vi. Depois de anos, atravessando a Ponte Principal, um rapaz me chama: – Marcelo!. – Oi, respondo. – Está me reconhecendo?, perguntou. – Não, falei. – Eu sou o Sérgio, se apresentou.
Poucas palavras, mas com olhares cúmplices e felizes, conversamos. Pelo caminho, agradecido, pensei: Obrigado Deus! Ganhei meu dia.