Crônica • Ele guardado é mais bonito

As misérias da vida me edificaram, construíram e me fizeram homem. Deus não dá maturidade a juventude e nem asa a cobra. A maturidade vem do caminhar com pés calejados, das rugas adquiridas e conquistadas com o olhar do tempo.

Ontem à tarde lembrei de um episódio que faz em mim morada, acontecido na juventude, quando morava no Rio de Janeiro. Por volta das duas horas da madrugada, caminhava perdido por Copacabana com o amigo-irmão Milton e um outro que não consigo lembrar quem era.

Com vontade, parei para mijar sobre o meio-fio. Quando estava acabando, vi uma mulher morena, magra, com aparência indiana, sentada na calçada com um cobertor fino acinzentado, tapando suas pernas, me olhando silenciosa.

Rindo, virei o pênis pra ela e balancei com insistência. Ela deitou, puxou a coberta para cobrir a sua vida digna sendo desprezada, e falou baixinho só para eu ouvir, uma frase que vou ter como companhia por toda vida: – Ele guardado é mais bonito!

Saí rindo, tentando disfarçar a minha vergonha. Fui embora para casa e entrei só no elevador. As quatro paredes não me acusaram, mas me olharam constrangidas e silenciosas. Até chegar no décimo segundo andar do prédio, o nó na garganta apertava.

Quando abri a porta do quarto e sala, onde morava, e entrei acompanhado da dor humilhante e da vergonha redentora é que veio o pranto com soluços. Minha mãe já falecida foi privada de passar por essa humilhação. Se ela estivesse viva eu não teria coragem de publicar este vexame.

Ela, que criou seus filhos com amor e educação, não aprovaria essa atitude vexatória. Publico hoje esse antigo segredo, sem ter vergonha, e dando a minha cara para bater, mesmo sabendo que meus filhos Pedro e Clara vão ler e enxergar as misérias do pai.

Também não me sinto envergonhado e diminuído, mas sim promovido e erguido pelo olhar misericordioso do amor incondicional.