Crônica • Eu e Milton nos Puteiros

Com 15 anos, na sala de aula do Colégio Brasil América (RJ), conheci o carioca Milton. – Sou capixaba, falei. Nos tornamos grandes amigos. Morava na rua Humaitá,144/502. Eu, numa quitinete. Avenida Nossa Senhora de Copacabana, 610/708.

Botava os matutos pés pra fora do prédio, uma boiada furiosa e poluída não me via e nem dava bom dia. Do lado esquerdo da quitinete 708 tinha uma alfaiataria com telefone e dois alfaiates: Silvio, gordo e sacana. Horácio, magro e carrancudo. Com bons causos e boas piadas, ficamos amigos.

Evitando incomodar, recebemos raras chamadas do número 2575851. A campainha tocava, alguém espiava pelo olho mágico e encarava o Horácio. Calça larga de tergal, cinto no último furo, camisa de botão e cabelo liso. Seco, falava sem olhar nos olhos: – Vem atender o telefone.

Caro leitor, meu irmão Beto, que também morava no 708, vai relembrar tudo isso. Milton passou a frequentar a quitinete e o Espírito Santo. Eu, o Bairro Humaitá. Ficou amigo da minha família e eu da dele. Quando dormia em sua casa, de manhã, íamos ao Clube Espanhol jogar futsal.

Foi trabalhar e casou com Aldenora, em Teresina, Piauí, onde mora. Fui padrinho. Tem duas filhas: Carolina e Mariana.

Dias atrás, por telefone, perguntei: – O que fomos fazer na rua Alice, bairro Laranjeiras, no famoso prostíbulo da casa rosa? Amigos leitores, devem achar a pergunta descabida. O que dois jovens fariam em um puteiro?

Milton responde: – Fomos na despedida de solteiro do Jorge, que jogava futsal com a gente.

Soneca, que também jogava, nos chamou para ir em sua boate em Copacabana. Fomos à “Boate” Franks Bar. No palco, um vale tudo com relações sexuais ao vivo. Um casal subiu ao ringue se acariciou e começou o ato. Soneca falou uma coisa que até hoje me faz matutar: – Esse casal é casado e o pai leva e busca a filha na escola.

Mais uma vez sem comer ninguém fomos para casa. Há dias falei com o Milton sobre esse casal da boate. – Acho que lembro disso, falou. Sem julgamentos, a Casa Rosa e a “Boate” Franks Bar me ensinam que sobreviver é um ato de coragem e amor à vida.