Em audiência pública, moradores se colocaram contrários à proposta da prefeitura de alargar a orla em até 70 metros na Praia do Morro. Comitiva vai se reunir com o DER para discutir o caso
Com cartazes e camisetas com dizeres: “Engordamento, não!”, moradores apresentaram argumentos contra o projeto da Prefeitura Municipal de Guarapari para ampliação em até 70 metros da faixa de areia da Praia do Morro. A manifestação ocorreu durante audiência pública realizada na última quarta-feira (22), pela Comissão de Proteção ao Meio Ambiente da Assembleia Legislativa (Ales), na Escola Estadual Doutor Silva Mello, no bairro Itapebussu.
O debate envolveu moradores, vereadores, ambientalistas, representante do Ministério Público Estadual e da prefeitura, além dos deputados estaduais Fabrício Gandini (PSD), presidente do colegiado, e Zé Preto (PL), requerente da audiência e morador de Guarapari.
A iniciativa de engordar a orla de uma das praias mais visitadas pelos turistas no Estado foi proposta pelo Executivo Municipal e está em análise no Departamento Estadual de Edificações e Rodovias (DER). O investimento, caso se concretize, é de cerca de R$ 150 milhões.
Uma das reclamações dos moradores que compareceram à audiência é a falta de comunicação sobre os desdobramentos e as fases do projeto. Houve alegação de que a prefeitura não atendeu aos pedidos de vista do documento e que não teria dado acesso para que a comunidade conhecesse o seu conteúdo.
A primeira explicação oficial foi dada pelo engenheiro responsável pelo projeto, José Carlos Guimarães, contratado pela gestão municipal. Ele contou que a empresa dele venceu a licitação para apresentar o projeto e que recebeu R$ 230 mil pelo trabalho.
O engenheiro explicou que recomendou, após estudos técnicos e laboratoriais, uma intervenção na orla por conta de processos erosivos, segundo ele causado por diversos fatores como: ocupação desordenada, elevação do nível do mar, dentre outros.
Assim, a faixa de areia seria aumentada em até 70 metros para melhorar as condições de trânsito de banhistas e a prática de atividades físicas, além de impedir o avanço da maré para o calçadão.
Porém, os argumentos dele foram rebatidos pelo geólogo Carlos Marchiori, especialista em análise de risco geológico, que estudou o caso voluntariamente e apresentou um laudo em que sustenta que o engordamento só se justifica quando há uma situação de perigo ou de dano iminente, o que, segundo ele, não é o caso da Praia do Morro.
Apresentando fotos da faixa de areia no ano de 2012 e comparando com imagens atuais, ele sustentou que houve, inclusive, um alargamento natural da faixa de areia e que a praia está em equilíbrio.
“Em Meaípe havia necessidade, mas na Praia do Morro não há essa erosão avançada (…) que precise de medidas técnicas. O engordamento pode trazer inúmeras consequências ambientais, pois as praias são os ambientes mais vulneráveis do planeta (…) e quando o homem ousa mexer nesse ambiente, que está em constante busca de equilíbrio, em 90% dos casos as intervenções não são eficazes”, defendeu.
A advogada Zaira Carvalho, que é membro da Associação de Moradores da Praia do Morro, foi uma das que disseram “não” ao engordamento. “O maior medo é que o mar fique profundo e que essa obra mate as nossas fauna e flora marinhas. E outra coisa, a nossa cidade tem outras prioridades”, apontou.
Maria de Fátima Fonseca, presidente da Associação de Moradores da Praia do Morro, também teme uma degradação ambiental. “Nós vamos perder toda aquela beleza, aquele contorno maravilhoso da praia, que é o maior atrativo turístico do Estado. E isso vai atrapalhar bastante a vida do turista, do morador, das crianças, dos idosos, das pessoas praticantes de esportes”, criticou.
E insistiu: “Hoje, a Praia do Morro tem cerca de 40 metros da extensão da areia. A previsão é que, com esse engordamento, ela ganhe mais 70 metros. Imagina 110 metros de areia totalmente mexida, que não é confortável para se pisar.”
Segundo ela, a Praia do Morro tem uma grande população de aposentados. “Com essa distância de praia, sol forte, como é que as pessoas vão se locomover? Em nossas conversas, muitas pessoas falaram que vão ter de pegar um Uber para chegar até o mar”, ironizou.
Lilia Nogueira, moradora da Praia do Morro, fez eco aos discursos. “A população não quer, o turista não quer e vamos lutar até que a nossa vitória seja garantida”, declarou.
A vereadora de Guarapari Rosana Pinheiro (Cidadania) afirmou que há outras prioridades para o município.
Diante das manifestações, Jeferson Garcia Lima, diretor de Obras de Infraestrutura Logística no DER, fez questão de frisar que o assunto será debatido com a comunidade. “O Estado não vai fazer obra nenhuma que desça de ‘goela abaixo’ dos moradores. Foi determinação do governador Renato Casagrande (PSB) de, antes de haver qualquer investimento, ouvirmos a população. E isso vai ser feito”, explicou.
Gandini destacou que a ata da audiência vai servir de documento para que o governo possa balizar a opinião da população, antes de deliberar sobre o investimento.
“Foi um grande avanço, e a comunidade pôde conhecer o projeto, principalmente porque existia dúvida se ele existia de fato (…). A Associação trouxe um geólogo que faz afirmações importantes, que precisam ser analisadas pelo setor competente estadual. A gente vai levar uma comissão daqui, dessa reunião, para conversar com o DER e verificar qual a disponibilidade do Estado de entender que não é de interesse da comunidade esse empreendimento aqui na Praia do Morro” finalizou.
Zé Preto disse que era importante continuar o movimento para que ele chegue ao governador. “A população ficou ansiosa ao saber da possível obra. Vereadores, sociedade civil, todo mundo procurou o nosso gabinete para impulsionar esse debate. Eu tenho certeza que nós vamos ser ouvidos”, frisou.