A obra está alçada nas linguagens e laboratórios de movimento das danças de matrizes afro-brasileiras e diaspóricas, as culturas de resistência, das diversas identidades, e na dança contemporânea
Para Rosas e Tridentes” toma como cerne para sua construção a linguagem artística da dança, enquanto habitação poética de manifestação de um pensamento reflexivo através do movimento corporal, e busca como base de reflexão a relação que se estabelece entre corpo, a arte e sagrado, bebendo na figura das entidades
Pombogiras e Exús – enquanto falanges da espiritualidade afro-brasileira – para tencionar o papel do corpo como terreiro na sociedade. São as narrativas que se alojam nesses arquétipos em amálgamas com as histórias e trajetórias de cada intérprete-criador/criadora.
A obra está alçada nas linguagens e laboratórios de movimento das danças de matrizes afro-brasileiras e diaspóricas, as culturas de resistência, das diversas identidades, e na dança contemporânea. Seu desabrocho se deu a partir da necessidade de trazer para a cena contemporânea a potência de ação, pelo movimento apreendido e executado nos terreiros capixabas, numa tentativa de desmistificar a corporeidade dessas entidades.
No desenvolvimento cênico, as rosas e os tridentes são levantados como transmutação poética da força desses arquétipos, sem a aplicação de uma ligação direta das rosas as Pombogiras, percebidas como femininas dentro dos terreiro, bem como os tridentes não estão diretamente atrelados aos Exús, percebidos como masculinos. A ideia é perceber na poética do movimento as densidades dinâmicas das pétalas, do perfume, dos espinhos como rosas ou tridentes. É uma simbiose que permite ao corpo de cada intérprete-criador/criadora encontrar em si, na relação com o outro e com o espectador, suas rosas e seus tridentes.
A obra, então, cria sobreposições de espaços de intimidade e da composição coletiva onde os ambientes se tornam outros através do contato e da troca de experiências. Solos, duos e trios são criados por unidades inusitadas ao tempo que o corpo se percebe acessando a força desses arquétipos, que carregam em suas narrativas a história de um povo marginalizado e subjugado, condenados ao sinônimo das ruas, e que revelaram no bojo de uma sociedade conservadora a pulsação de resistir para viver. Assim, conversando com tensionamentos sociais atuais, como a corporeidade das identidades femininas, as lutas LGBTQiA+ e o corpo negro na cena contemporânea ao tempo que questiona a forte tentativa de apagamento do corpo e das referências negras através da criminalização e demonização, por parte da composição social hegemônica, das espiritualidades afro-brasileiras.
Como estratégias de criação a obra bebe no método do BPI (BailarinoPesquisador-Intérprete) proposto pela artista e pesquisadora, docente do Instituto de Artes da UNICAMP, Graziela Rodrigues e da Teoria Fundamentos da
Dança, de Helenita Sá Earp, responsável pela criação dos Cursos de Graduação em Dança da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Métodos esses, que possibilitam o fazer poético em dança através da apreensão prática de elementos de um determinado lócus partindo da vivência e da troca em campo, o que permite também a criação de algumas células coreográficas no instante do ato cênico e que inseridas durante a apresentação, deixam brotar momentos de unidade mais palpável (no movimento) em contraposição à unidade mais subjetiva do assunto e do jogo cênico.
Para Rosas e Tridentes” é, então, força de Exú e Pombagira abrindo caminhos para um novo perceber do mundo e as novas possibilidades de criar arte e cultura frente aos novos moldes de estar em sociedade, é a possibilidade de outras habitações do ser (corpo). É colocar na cena artística o Povo da Rua”, cultuado nos terreiros, para uma conversa com esses corpos que se manifestam diariamente para dar vez e voz às suas identidades. É a cena contemporânea convocando o sagrado e o mundano, passado e presente, espíritos e matérias para comungar pensamentos dançantes.
FICHA TÉCNICA
Concepção, Direção Geral e Coreografia: Maytê Hensso;
Produção Técnica e Executiva: Maytê Hensso e Lalau Martins;
Elenco: Abayomi Queiroz, Jadson Titânio e Mattheus Schirffimaan;
Preparação Corporal: Lalau Martins;
Concepção e Direção Musical: Lucas Fraga;
Concepção e Confecção de Cenário: Maytê Hensso e Claudinei Souza;
Concepção e Confecção de Figurino: Lalau Martins e Maytê Hensso;
Fotografia de Divulgação: Mariana Reis;
Registro do Processo (Foto e Filmagem): Lalau Martins, Thaís Vieira e Jhonatan Medeiro;
Direção de Comunicação e Design: Jhonatan Medeiro;
Assistente de Produção e Administração de Recursos: Mattheus Schirffimaan;
Apoio Técnico e Cênico: Claudinei Souza e Sabrina Silva;
Apoio: Funcultura e Governo do Espírito Santo
Realização: Descalços Cia de Artes
Produção: Maytê Hensso Criações Artísticas
Parceiros: ORBE, MUCANE, Casa da Música Sônia Cabral e CRJ Castelo Branco.
Serviço
23 de fevereiro de 2024 – Sexta-Feira – 19h
Palácio da Cultura Sônia Cabral – R. São Gonçalo – Centro – Vitória (ES) – (27) 3132-8399
Entrada Franca
Duração: 55 minutos
Classificação livre e indicativa para todas as idades.