Na avaliação do historiador Jean Marcel Carvalho França, os debates sobre a legalização da Cannabis medicinal têm avançado pouco no Brasil por causa de preconceitos. França, que é professor da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e autor do livro História da Maconha no Brasil (Editora Jandaíra), lembra que se construiu no passado a visão negativa da Cannabis como uma droga de pessoas pobres e negras que leva à vadiagem, a transtornos psíquicos e a comportamentos criminosos. Esse estigma impulsionou o proibicionismo e permanece, ainda que cada vez menos, diz França, prejudicando os doentes que precisam das substâncias terapêuticas da erva.
— A maconha ajuda a financiar o crime organizado e está ligada à violência. Nas discussões a serem feitas, é preciso mostrar que se pode, sim, retirar a Cannabis do circuito do crime. Quando há plantio legalizado, controlado e com fins medicinais e científicos, o tráfico perde terreno, e a vida de doentes, médicos e pesquisadores fica mais fácil — afirma o historiador.
No Brasil, não há regulamentação para o plantio da erva e a produção de medicamentos, atividades que não são autorizadas. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) libera a importação controlada de remédios a partir de pedidos de pacientes.
No Senado, onde tramitam projetos de lei que tratam do tema, a Cannabis medicinal divide opiniões. Para o senador Eduardo Girão (Podemos-CE), “a liberação do plantio significaria uma porta aberta para que o mercado bilionário da maconha recreativa crie tentáculos no Brasil”.
Para o senador Flávio Arns (Podemos-PR), a regulamentação é urgente, para que as pesquisas avancem e os doentes sejam beneficiados. A senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) entende que “o Brasil não pode ir na contramão de 40 países que já legalizaram a Cannabis medicinal”.
Estudos científicos mostram que substâncias da Cannabis amenizam dores, inflamações, náuseas, falta de apetite, descontrole muscular, transtornos psiquiátricos e crises epilépticas. Beneficiam-se dela, por exemplo, pacientes de Parkinson, Alzheimer, esclerose múltipla e depressão. Embora não curem as doenças propriamente ditas, as substâncias aumentam a qualidade de vida das pessoas.
Em outubro, o Conselho Federal de Medicina (CFM) baixou uma norma estabelecendo que os médicos podem receitar esse tipo de medicamento só para dois tipos de epilepsia e nenhuma outra doença. Diante do protesto de doentes, o CFM decidiu suspender a norma e ouvir sugestões da sociedade até dezembro para redigir uma nova regra. O senador Confúcio Moura (MDB-RO) apoiou o protesto das famílias e a decisão do CFM de reabrir consulta pública.
por Ricardo Westin, Agência Senado